Judy Velasquez

O vídeo “Habito o chão” é composto de dois registros que acontecem na cidade de Guarapari – ES. Assim como Hamish Fulton encara em seu trabalho o fato de que não há representação que comporte a experiência do caminhar, também me mantenho consciente de que as percepções de uma caminhada são mais do que imagens e sons. Mas o movimento do pé e o movimento da pessoa capturados no vídeo são os tecidos de uma costura na superfície do mundo que constituem o trabalho. Ao relacionar estas formas de experienciar os solos: a areia – superfície viva – ou a camada dura que é o asfalto, encontro uma linha sinuosa. O vídeo é um ponto de parada em um percurso em ziguezague, apenas um vértice de uma experimentação que está em andamento.

Na memória da relação com minha avó durante a infância vivida em Guarapari, reencontro o ziguezague como modo de enfrentamento da rua íngreme. A partir desta prática vernacular para atenuar o cansaço da subida, lancei-me numa investigação.

Caminhei um percurso poético no Litoral Norte da cidade, transitando entre os elementos que surgiram: a areia, o passado, a ruína, a oscilação. No contexto da pandemia de COVID19, a rua está em suspensão necessária, porém a cidade turística que convive com o fluxo cheio/vazio, alta e baixa temporada, permite uma alternância de ritmos para o morador que habita a cidade. Na cidade vazia, vou me deslocando (quase sempre) entre atividades essenciais e criando os registros com a câmera digital portátil. Assim que a próxima leva de turistas invade a praia, e a ansiedade e o medo me tiram completamente o espaço da rua, recrio os registros na montagem, juntando peças de um quebra-cabeça que se reconfigura sempre.

O interesse pelos movimentos humanos constituiu um interesse contínuo e persistente durante a graduação. Nesta pesquisa, encontrei no caminho tantos outros elementos que se tornaram essenciais: o ziguezague, a memória, a cidade, a rua. O trabalho é o percurso, neste caso, uma experiência de descoberta e construção, que é o próprio processo criativo. Por isso, além do vídeo “Habito o chão”, produzi muitos outros que não são finais, são meios, e também um livro que é um relato poético e o resultado das minhas coletas. O percurso e a investigação seguem.